Shots de Dopamina
Com o verão a terminar, decidi escrever uma crónica um pouco diferente do habitual, e partilhar convosco algumas experiências que tive estes meses que chegaram ao meu top 3 de shots de dopamina.
Enquanto membro da Geração Z, tinha obviamente de entrar nesta trend em que todos se sentem cientistas a falar das hormonas cerebrais, incluindo a dopamina - que, aparentemente, é a responsável por nos dar aquela sensação imediata de recompensa. Uns dizem que é a hormona da felicidade - outros dizem que funciona como uma moeda de troca da nossa motivação.
Eu, que não sou formada em ciências nem nada remotamente parecido, prefiro entendê-la como um sinal de que algo valeu realmente a pena - que aquela foi uma experiência que acendeu algo em mim e me fez pensar "isto de viver é mesmo bom".
As experiências que partilho não seguem nenhuma ordem específica - fui escrevendo à medida que me fui lembrando. O objetivo é, quem sabe, inspirar alguém a tomar um destes shots - se dopamina for o que estão à procura - mas, também, guardar este texto como uma espécie de diário digital para mais tarde recordar.
1. Concertos
Os meses de verão são marcados por um ambiente de festa: as ruas enchem-se de festas populares, há mil festivais diferentes, música ao vivo, bancas de comida e uma energia que parece dizer-nos diz que a noite vai ser longa.
(E depois, convenhamos, em anos de eleições os concertos grátis nas festas das cidades parece que se multiplicam como por magia!)
Disse que a lista não ia seguir nenhuma ordem, mas parece que menti - acho que ir ver concertos são o meu shot nº1 de dopamina. Não há outra sensação igual como à de estar no meio de uma multidão desconhecida, todos a cantar e a dançar ao som da mesma música, mesmo que cada um a ouça com ouvidos e interpretações diferentes.
E até quando não nos identificamos com a história que o artista nos está a contar, há algo de vibrante na forma como a música consegue unir todos por alguns minutos, quase como se partilhássemos as dores uns dos outros. Para além disso, não há mal nenhum em cantar (que é como quem diz berrar) desafinados à beira de pessoas que nunca mais vamos ver na vida.
Não posso deixar de aproveitar este momento para demonstrar o meu agrado na aposta na música portuguesa, que se reflete, por exemplo, nos festivais que enchem palcos principais com grandes nomes nacionais e plateias que se enchem até não haver espaço para nem mais uma cabeça (ou - como estamos no século XXI e tudo o que acontece tem de ser registado - não há espaço para nem mais um telemóvel).
O meu destaque vai para os concertos que tive o privilégio de assistir dos Quatro e Meia, Carolina Deslandes e Bárbara Tinoco.
2. Feira do Livro - em especial, as bancas dos alfarrabistas
No verão passado visitei uma livraria em Gent, onde fui apresentada - pela primeira vez - a este mundo das livrarias com livros em segunda mão. Para além dos preços muito mais simpáticos para o leitor, o livro em segunda mão traz duas histórias - a que conta nas suas páginas, e a de quem a leu. Se tivermos sorte, apanhamos livros com anotações e temos o privilégio de entrar, por breves instantes, nos pensamentos do dono anterior.
Este ano, na Feira do Livro do Porto, voltei a sentir esse fascínio. A Avenida das Tílias encheu-se de bancas com todo o tipo de livros — desde os lançamentos mais recentes que marcam tendências, aos exemplares mais antigos e usados na zona dos alfarrabistas. A minha zona preferida foi esta última. Há algo de mágico ao passear com calma entre os corredores, folhear as páginas dos livros que já tiveram outra vida antes daquela, descobrir autores antigos e histórias que, para nós, são novas.
Acabei por trazer dois livros: um sobre Leonardo da Vinci e outro sobre Van Gogh. E a melhor parte é que o pico de dopamina não se esgotou na tarde em que passeei pela Feira do Livro e fiz estas compras - estende-se para todos os momentos em que leio estes livros, ao mergulhar no mundo da arte do qual gosto tanto de aprender mais sobre.
3. Imersão na Natureza
Digo muitas vezes, meio em tom de brincadeira, meio a falar a sério, que - preciso de ir abraçar uma árvore. Que é como quem diz sentir a relva nos pés, ou respirar o ar dos montes. Conectar-me com a Natureza, ver as estrelas e perceber que realmente somos mesmo pequeninos no meio da imensidão que é o que nos rodeia.
A dopamina que me traz estar rodeada de Natureza é diferente da dopamina das experiências anteriores. Nestes momentos, não há um pico de emoção - é uma sensação um pouco mais calma, mais serena, mas ainda assim com o mesmo pensamento que nos diz é mesmo aqui que devia estar.
Clichés à parte, estar na Natureza pode não nos dar respostas, mas dá-nos o presente. Faz-nos focar no agora - porque torna-se impossível olhar para o horizonte que nunca mais acaba e não nos sentirmos gratos por podermos estar ali a poder experienciar aquele momento.
O pôr-do-sol, que todos os dias é diferente, todos os dias entusiasma. O mar cujas ondas batem sem ritmo e mesmo assim parecem trazer consigo uma melodia hipnotizante. O cheiro a verde que nos faz acreditar que, afinal, as cores têm odor.
E não precisamos de ir para longe para sentir esta conexão com a Natureza - às vezes, um simples passeio no Parque da Cidade vai fazer exatamente isso (sim, mesmo com o barulho dos carros de fundo que por vezes se ouve).
Seja onde for, acredito que a contemplação da Natureza nos traz sempre algo - seja dopamina ou calma o que procuramos, sabemos que no meio do mundo todo algo havemos de encontrar.
A estação ainda não mudou, mas acho sempre bom parar para refletir no que nos faz bem - para podermos fazer mais disso.
A vida consegue ser mesmo boa - temos é de ativar os gatilhos certos.
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