O passado ao espelho
Uma vez ou outra, vem o passado bater-nos à porta. Insiste em entrar pelo presente adentro, e não sai até muito insistirmos.
E quando o passado vem, o que é que vemos? Fragmentos da pessoa que um dia fomos e já não mais somos, ou então sentimentos que jurávamos que nunca íamos esquecer. Memórias que já nem sabíamos ter, e arrependimentos que se calhar ainda temos. Vemos toda a mudança que (felizmente) aconteceu, e a certeza que os maus momentos também têm um fim. Se calhar, alguma saudade do que foi e já não é, ou nostalgia do que nunca parou de ser, mas que, se virmos bem, já passou também.
Sabemo-lo de cor: o passado não tem nada de novo para nos dizer. Mas o nosso presente tem maneiras diferentes de olhar para o que passou. E ainda bem!
Nada é tão bom como uma nova perspetiva sobre o que durante tanto tempo nos atormentou. Uma nova forma de ver aquela coisa que insistia em assombrar-nos os pensamentos. Ou a simples realização de que aquilo de que tanto falávamos já não é, sequer, assunto do coração nem da razão.
Claro que pode ser difícil vermos o passado ao espelho: vemos quem éramos e vemos que já não nos identificamos mais com essa pessoa. Somos estranhos de nós próprios - e quão estranho isso é? Ou então vemos quem fomos e só pensamos em como gostávamos de voltar a ser assim.
Vemos os erros que mais tarde foram lições, e se calhar até nos culpamos de não termos visto isso mais cedo. Vemos os rótulos a serem colocados e sabemos, com a distância do presente, que já nada podemos fazer contra isso. Vemos momentos felizes que infelizmente não voltaram, e momentos tristes que felizmente passaram. E percebemos que o tempo às vezes corre e outras vezes passa devagar.
Mas já sabemos: seja como for, o tempo passa, e quando corre, corre sempre para a frente.
Agora, já não dá para voltar atrás.
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