Inveja Boa
Quando me pedem para descrever o meu estilo de escrita, digo que escrevo o que gostava de ler - mas mais vezes acontece quase o contrário: acabo por ler o que gostava de escrever.
Desde que criei este blog adquiri toda uma nova experiência de visão - no fundo, é como dizer que abri os olhos para o mundo. Comecei a reparar no que lá está para além do que cá está. O que antes era monótono e rotineiro transformou-se em fonte de criatividade. O que outrora eram experiências soltas são agora ideias vertidas no papel e escrutinadas até ao mais ínfimo detalhe nesta busca incessante por inspiração. E o que antigamente lia e passava despercebido tornou-se na fonte de um novo sentimento que ando a experienciar - uma certa inveja das combinações das palavras e frases que alguém fez antes de mim.
Pois é, quando comecei a escrever ganhei uma pequena inveja do que os outros escrevem. Leio-os e penso no quanto gostava de ter sido eu a escrever aquilo primeiro. Como gostava de ter sido eu a pioneira daquela ideia, a inventora daquela melodia de palavras.
E apesar do sentimento ter um nome feio, gosto de olhar para esta inveja recém descoberta de uma perspetiva que me permite tirar dela o melhor partido. A inveja pode ser um bom sentimento para se ter quando queremos despoletar a inspiração para criar algo verdadeiramente autêntico. É fácil ficar preso nas palavras dos outros, o desafio é conseguir utilizá-las como catapultas para o (difícil) caminho que é encontrar a nossa própria voz. E isto exige um processo moroso de escrever, apagar, reescrever, duvidar, questionar, inspirar, apagar de novo e escrever mais uma vez.
Ao fazer por converter a inveja em inspiração, percebo que a criatividade é um processo coletivo, onde o que vejo e tanto gosto me estimula a querer fazer mais, a querer fazer diferente, a querer questionar e a querer criar.
A verdadeira originalidade, tenho vindo a perceber, não é a criação de algo completamente novo e nunca antes visto, mas sim a re-interpretação e interligação de coisas que já foram feitas, com o cunho dos olhos de alguém que vê isso de uma maneira diferente.
Cada texto que leio alimenta a minha narrativa. Cada obra de arte que conheço convida-me a ver o que vejo de forma diferente. Cada música que ouço faz-me querer desenhar a minha própria melodia.
E sigo assim, a sentir uma inveja bonita da arte que tenho a sorte de me rodear, e a sorrir por saber que isso me faz querer fazer mais. Cada vez mais.
M