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Designing My Dream Life

27 de Dezembro, 2023

Indícios Trágicos?

No secundário falamos e abordamos várias obras literárias dos grandes escritores portugueses. Gostos e preferências à parte, havia sempre um aspeto das análises que eu não percebia: os indícios trágicos.

Era a decadência do Ramalhete que fazia pressentir um final desastroso. Eram os quadros a arder no Palácio de Manuel de Sousa Coutinho que prognosticavam que D. João ia mesmo regressar. Ou então eram todos os acontecimentos dramáticos a ter lugar (coincidentemente) à sexta-feira - que aparentemente é o maior presságio de todos.

Todos estes acontecimentos que, mal acontecem, nos indicam que o final não será tão feliz como gostaríamos são os chamados indícios trágicos.

O que me metia muita confusão era o facto de nós só conseguirmos identificar determinado acontecimento como certamente um sinal de um final infeliz quando já sabíamos o fim que nos esperava. No fundo, só numa segunda leitura é que éramos capazes de identificar todas as premonições trágicas espalhadas pelo texto – porque já sabíamos o que procurar.

Depois, tentava perceber se dava para aplicar esta "teoria dos indícios trágicos" à vida real, e começava a pensar se seria possível identifica-los no nosso quotidiano mundano, fora da realidade cuidadosamente criada e planeada por Eça ou Garret.

Será que o vislumbre de umas nuvens cinzentas num dia solarengo de verão nos indica que o que está a correr bem pode vir a correr mal? Será que o número da porta da loja onde vamos tem um significado oculto e quer-nos avisar de uma reviravolta inesperada? Ou será que a imprevisibilidade da vida nos impede de ler nas entrelinhas das nossas narrativas um destino certo?

Quero acreditar que somos nós os autores da nossa história, e que conseguimos mudar o enredo dos capítulos futuros. Ao contrário do que acontece com as personagens das grandes obras, a nossa vida não está já marcada com tinta preta num livro grande cujo fim é conhecido por todos (até por quem não o leu).

Acredito no libertismo q.b. e oponho-me à ideia de um determinismo tão radical ao ponto de cada sinal ser mesmo um indício trágico, e não só uma aleatória coincidência.

(Mas isso já é todo um outro debate.)

M