As emoções também sabem falar
As emoções também sabem falar. Mas ainda antes da difícil tarefa de as ouvir, surge a dificuldade de as identificar. O que aconteceria se lhes atribuíssemos caras e corpos? Seria assim mais fácil perceber como é que tudo funciona dentro da nossa cabeça?
É precisamente desta premissa que parte o filme Inside Out (em português, Divertidamente), cuja sequela já se encontra nos cinemas.
[Antes de avançar na leitura, deixo aqui o aviso de que esta crónica contém alguns spoilers da história!]
Neste segundo filme, surge um novo conceito, que achei especialmente interessante: o sentido de identidade de Riley, a personagem principal. No fundo, são as suas crenças e memórias que, juntas, funcionam como uma estrela polar nas encruzilhadas de decisões da vida. Mais do que mostrar o que Riley efetivamente é, este sentido de identidade pretende representar como é que ela se vê.
Com a chegada de diferentes emoções - com especial destaque para a Ansiedade - o sentido de identidade começa a ser alterado. Esta nova personagem, dizendo estar-se a preparar para o futuro, começa por arrancar o antigo sentido de identidade da menina (outrora preenchido apenas de crenças e memórias felizes) e começa, lentamente, a criar um novo.
O novo sentido de identidade é, agora, baseado em premissas falsas manobradas pela ansiedade, que alteram a forma como a menina se vê a si própria. Deste modo, acabam por se criar determinados pensamentos que, de certa forma, limitam a sua atuação na vida real.
O filme está, na minha opinião, extraordinariamente bem construído, representando de uma forma aparentemente simples a tão complexa dinâmica de emoções humanas. Percebemos que, muitas vezes, as realidades que criámos dentro da nossa cabeça não correspondem à realidade, e que quase sem darmos conta, desenvolvemos crenças - sobre nós, e sobre o mundo - que acabam por nos limitar.
Mas a história vai mais longe e mostra-nos como as emoções não estão a trabalhar contra nós. Todas as diferentes emoções existem - e têm de coexistir - e pretendem, tão só, proteger-nos. Cada emoção - mesmo aquelas consideradas negativas - são importantes e desempenham, também, um papel fundamental na nossa vida.
Inside Out vem precisamente mostrar como cada emoção é essencial e como a integração saudável de todas elas é fundamental para o bem-estar emocional.
No final, a mensagem é clara - e, na minha perspetiva, muito bonita e comovente: a aceitação e compreensão das nossas emoções são fundamentais para a construção de um novo (e agora genuíno) sentido de identidade, saudável e equilibrado. Já não importam apenas as memórias e crenças felizes - todas são bem-vindas e necessárias para a edificação de um eu completo e autêntico.
Percebemos que um sentido de identidade vigoroso não é aquele que ignora ou rejeita as emoções desagradáveis, mas sim aquele que as acolhe e as entende.
Podemos - e devemos - ter um sentido de identidade que abraça e acolhe também as fragilidades, ao mesmo tempo que faz espaço para as conquistas e alegrias, sem menosprezar nenhuma emoção.
A lição que o filme nos deixa é de esperança: é possível construir um sentido de identidade autêntico e completo que valoriza todas as partes da nossa labiríntica experiência emocional.
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