Seremos como os macacos?
A teoria da evolução de Darwin diz-nos que evoluímos dos macacos, pondo a coisa assim de uma maneira simplista. Com o passar do tempo, esta evolução terá ocorrido não só a nível físico mas também a nível cognitivo. Partilhamos o polegar oponente com os nossos irmãos primatas, mas a racionalidade do ser ficou toda para nós (comuns mortais).
Há uns tempos ouvi falar de um estudo que pretendia medir os níveis de dopamina no cérebro antes da recompensa e depois desta ter sido atingida. Este estudo foi feito em animais - mais concretamente (vai se lá a ver!) em macacos!
Os resultados foram mais ou menos surpreendentes. Os macacos foram treinados para realizar tarefas que, uma vez cumpridas, davam direito a uma recompensa. Os animais não eram burros (...eram macacos!) e começaram a aperceber-se do padrão - isto é, começaram-se a pressentir a antecipação da recompensa. O macaco percebia que ia ganhar a tão desejada recompensa e isso aumentava a motivação dele para o desempenho da tarefa em mãos (ou...patas).
E o que é que isso interessou aos neurologistas? Ora, o que o estudo veio mostrar foi que a antecipação da recompensa era, a nível cerebral, mais estimulante do que a recompensa em si. A dopamina, afinal, não se produz com a felicidade nem com o prazer em si, mas sim com a sua procura.
Segundo os entendidos, a dopamina é uma substância química produzida pelo cérebro que desempenha um papel crucial em diferentes funções, nomeadamente a nível da motivação (sabem? aquela coisa que todos dizemos precisar para agir, em vez da tão necessária consistência).
Mas seremos nós - humanos (alegadamente) dotados de capacidade racional e emocional - como os macacos? Será que o nosso cérebro fica elétrico com a possibilidade da recompensa mais do que com a recompensa em si? Será que somos a personificação daquele ditado popular do burro a correr atrás da cenoura?
Bem, parecem achar que sim. Aliás, pelo que percebi toda a ideia do estudo era precisamente essa: estabelecer, por analogia, a nossa reação cerebral à antecipação da recompensa tendo em conta o resultado do estudo feito em macacos.
Não tenho, como devem imaginar, máquinas em casa para medir o meu nível de atividade cerebral no momento pré-recebimento-de-recompensa, mas até certo ponto consigo perceber como nos podemos assemelhar aos macacos do estudo. Muitas vezes, pomos tanta ênfase no processo, na luta, no percurso que quando chegamos ao destino final (a tal recompensa) se calhar já toda a motivação parece ter-se perdido pelo caminho. Parece que, de certa forma, somos mais impulsionados pelo que podemos atingir na meta do que pelo que realmente vamos alcançar.
Isto pode ser bom e pode funcionar a nosso favor - mas todas as moedas (que vi até agora, pelo menos) têm dois lados, e esta coisa da antecipação-da-recompensa-como-coisa-boa não é exceção. Às vezes, pode acontecer ficarmos tão focados nesta busca incessante pela recompensa que damos por nós a viver sempre no futuro. Nem aproveitamos o presente em que estamos, nem o futuro que tanto ansiamos realmente chega, porque quando finalmente recebemos a recompensa o nosso cérebro, aparentemente, já está a libertar dopamina a pensar na recompensa seguinte - não chegou a apreciar a recompensa que passámos os últimos tempos a tentar alcançar.
Aquela expressão popular "o importante é o caminho, e não o destino" não é , vamos a ver, tão precisa quanto isso: afinal, vieram-nos mostrar os macacos, o importante no nosso cérebro é precisamente ir atrás do destino, o caminho não vale para nada.
É interessante pensar que apesar de toda a evolução e apesar de tudo o que agora nos distingue dos macacos, ainda partilhamos com eles certos impulsos instintivos. Fica, como se costuma dizer em inglês (mas traduzindo para a nossa língua, porque não sei se os macacos falam estrangeiro), comida para pensamento.
Seremos como os macacos? Ou a escalada é mesmo mais importante do que o cume do monte?
M