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Designing My Dream Life

18 de Agosto, 2023

Direito de identidade

A Constituição, no seu trigésimo terceiro artigo, consagra o direito à identidade, que se refere não só ao direito a um nome, como também direito ao conhecimento da identidade dos progenitores. Mas será que a nossa identidade se resume apenas a isto? 

Então e a identidade fora da lei? Quem é que somos fora do cartão de cidadão que, cumprindo a norma constitucional, nos diz o nosso nome e o dos nossos pais?

(E será que temos o direito de descobrir isto? Ou será mais um dever?)

Crescemos a dizerem-nos "és tão isto" ou "devias ser mais aquilo", e crescemos a acreditar que é isto que somos e que é aquilo que devíamos ser. Durante muito tempo isso é suficiente, e basta para preencher todo o direito de identidade que ainda não sabemos ter.

Depois crescemos mais e descobrimos o que gostamos, e de quem gostamos, e percebemos aquilo com que já não nos identificamos. Perguntam-nos o que queremos ser quando crescermos e pensamos que já estamos fartos de tanto crescer. Imaginamos o futuro com base no que sempre nos disseram no passado, e respondemos a essa pergunta a pensar em quem gostavamos de ser.

A certa altura, o médico diz-nos que já não crescemos mais. E é nesse momento, quando paramos de crescer, que pensamos mais a sério no que vamos querer fazer. Agora sim, é a valer.

Dizemos que devemos a nós próprios descobrirmos quem somos para além dos nossos cromossomos. É o tal dever de identidade.

Mas e depois? O que é que não estamos a ver?

Depois, chega a altura de descobrirmos quem queremos ser - e é este o nosso direito de identidade.

M

16 de Agosto, 2023

Olhar para as estrelas

O tempo que a luz das estrelas demora a chegar até onde estamos pode ser suficiente para elas morrerem. Assim, quando olhamos para o céu, estamos a ver uma luz que foi emitida há muito tempo, por uma estrela que pode já ter colapsado. E é por isso que se diz que quando olhámos para o céu estamos a olhar para o passado

Inclinamos a cabeça para trás, damos um jeito ao pescoço, e contemplamos a imensidão do que já não está lá, e a nossa pequenez tão acentuada no meio do enorme céu estrelado. Olhamos para o passado e vemos tudo o que já não é, todas as versões de nós próprios onde já não nos reconhecemos, e todos os momentos que ficaram perdidos no contínuo do espaço-tempo.

Tentamos não cair na tentação de ficar presos nessa luz que, na verdade, já não existe. Essa luz que só chegou até nós porque estamos muito longe do lugar onde nasceu. E depois, trazemos a nossa atenção para o presente. O presente que se contenta em contemplar as constelações, conectar os confetes cintilantes do céu e criar formas imaginárias.

De repente, cai uma estrela cadente e cumprimos o mito: pedimos um desejo. Nesse momento, pensamos no futuro e em como queremos que ele seja. Onde estamos, com quem estamos, e como estamos. Pedimos um desejo, e acreditamos com tudo o que temos (e já tivemos) que o que desejamos é o que teremos.

Passa um avião e apercebemo-nos que também nós estamos a viajar: pelo presente, pelo passado e pelo futuro. Rapidamente voltamos para onde realmente estamos: no agora, longe de onde as estrelas nascem e morrem, afastados de um passado que não vai voltar (para o bem e para o mal), e ainda distantes de uma versão esperada do futuro que, para já, não chegou.

Agora, tudo o que podemos fazer é continuar a olhar para as estrelas.

M

14 de Agosto, 2023

Deus (não) existe

Enquanto coisa terrena, como tantas outras que sabemos existem (por exemplo, madeira, comida, ou um animal), Deus não existe.

Partir desta premissa não me parece errado: Deus nunca foi visto no plano 3D, nunca foi tocado com o mesmo sentido do tato que faz festinhas a um cão, e nunca se o ouviu falar da própria boca.

Acontece que a fé - já sabemos - baseia-se numa outra premissa: acreditar sem ver; acreditar sem tocar, e acreditar sem ouvir. Mas a verdade é que tantas vezes O vemos, tocamos e ouvimos.

Deus existe no sorriso acolhedor do outro, na calma da Natureza e nas palavras que nos dizem exatamento no instante em que precisávamos de ouvi-las. Deus vê-se nas noites de céu estrelado, sente-se na brisa do vento que sopra precisamente no momento certo, e ouve-se em tantas músicas e orações partilhadas.

Aliás: se procurarmos bem, reparamos que conseguimos encontra-Lo em todo o lado. Basta olharmos com atenção.

M

11 de Agosto, 2023

Final Feliz

Gosto de comédias românticas. Sim, são previsíveis. Sim, a meio do filme já conseguimos adivinhar como vai terminar. E sim, aquilo nunca aconteceria na vida real.

Mas e qual é o mal de querer alguma previsibilidade? Sabe bem sabermos com o que contar. Há uns tempos, escrevi aqui no blog sobre quão confortável pode ser ver filmes repetidos. Acho que este conforto também se encontra nestes desfechos calculáveis. É que o filme pode dar as voltas que der, e nós podemos encontrar alívio em saber que vai acabar bem.

Para além disso, a irrealidade da coisa é o que torna, na minha perspetiva, estas comédias românticas ainda mais atraentes. O que seria um filme sobre uma pessoa comum, a viver uma vida comum, onde nenhum encontro inesperado ou nenhuma "coincidência" feliz tem lugar? Sabe bem usarmos estes filmes como uma espécie de escape ao que pode ser a monotonia das nossas vidas. Durante umas horas, estamos envolvidos num mundo de faz de conta, onde todas as expectativas são correspondidas e as dificuldades funcionam como catapultas para um desfecho bonito.

Gosto de comédias românticas. Sabemos que vamos ver um final feliz.

E quem não quer um desses?

M

07 de Agosto, 2023

O que fica

Por vezes, os caminhos desencontram-se, os valores mudam e o tempo, simplesmente passa. Não tem de doer, mas saber isto causa tristeza: nem todas as pessoas que passam na nossa vida ficam nela para sempre.

(E é assim que é para ser. O amigo de sempre transforma-se num estranho que esperamos não encontrar na rua. A presença constante é, agora, só um par de mensagens que se trocam no aniversário. E a melhor companhia daquela altura está noutro país, noutra cidade e numa outra vida totalmente distinta da nossa.)

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(fonte: Pinterest)

É normal que o convívio contínuo se transforme num espelho de ações. Mas é quando a pessoa vai embora que nos apercebemos do que ficou de quem foi. Não ficam só as memórias ou as saudades. Não ficam só os momentos, as rotinas perdidas ou os planos que já não se vão realizar. Ficam, também, pequenos hábitos e manias. Ficam novos gostos, novos jeitos de fazer as coisas e novos tiques.

Quase sem repararmos, damos por nós a repetir uma frase que o outro dizia sempre. A fazer um pedido diferente no restaurante de sempre, e a voltar a comprar o perfume que nos ofereceram há tanto tempo porque ficamos fã do cheiro.

Por vezes, a ausência de quem não ficou dói. Mas é tão bonito encontrarmos pedaços dessas pessoas em nós: quase que parece que nunca foram embora.

M

04 de Agosto, 2023

Às vezes para o mundo

O dia corre mal e de repente parece o fim do mundo. Queremos que tudo pare connosco, para nos acompanhar no nosso silêncio e movimento estático. 

No dia seguinte acordamos e descobrimos que, afinal, o mundo não parou e o sol voltou a nascer. E termina o dia, a Terra gira e o sol põe-se no horizonte. Nesse momento, todos param o que estão a fazer (e, desta vez, param mesmo) para ver o que acontece todos os dias e mesmo assim continua a surpreender.

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A perspetiva é uma coisa engraçada. Estamos tristes e parece que o mundo acaba. De repente, estamos sentados numa esplanada e parece que é o sol que se está a mexer.

(Mas sabemos bem que o sol está sempre parado, e que nenhum dia mau há de durar para sempre.)

M

02 de Agosto, 2023

Quando falta a coragem

Usamos e abusamos da desculpa de que não temos coragem. Sem darmos por isso, construímos à nossa volta uma espécie de escudo, uma proteção de tudo aquilo que faríamos se... Não fosse essa coragem que não temos e já tínhamos ido, e feito, e dito.

Entretanto, arranjamos novos sonhos, mas rapidamente nos apercebemos que com eles vêm também novos medos. E voltamos a dizer que não dá. Quando nos perguntam porquê, a resposta vem fácil: não tenho coragem.  

E a história vai-se repetindo. 

Esta narrativa pode mudar se percebermos uma coisa: a coragem não é - nem tem de ser - a ausência do medo. O medo paralisa, é certo. O medo diz-nos que é mais fácil e mais seguro ficarmos parados no mesmo sítio, do que irmos fazer o que tanto gostávamos. Mas é a coragem que nos dá a astúcia de dizer vou com medo, mas vou. É a coragem que nos faz dar o salto e nos permite arriscar.

O que farias se tivesses coragem? As respostas sinceras abrem um espacinho entre o escudo que nos protege desta ideia de que a coragem é tudo que é preciso, e nos permitem entrar num mundo ideal, onde não falta coragem, o medo não tem lugar, e todos os objetivos e sonhos se concretizam.

Podemos saber de cor a resposta a esta pergunta. Mas é o que fazemos com ela, depois, que realmente conta.

 

E quando falta essa coragem?

Vamos sem ela.

M